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2000 – Menção honrosa Prêmio IAB-SP, categoria Arquitetura de Interiores, Instituto de Arquitetos do Brasil, São Paulo
Descrição:
No ano 2000, quando se comemoravam os quinhentos anos do descobrimento do Brasil, a Associação Brasil 500 Anos, cujos principais responsáveis eram originários do corpo técnico e diretivo da Fundação Bienal de São Paulo, promove um conjunto de treze exposições simultâneas, todas elas realizadas nos edifícios do Parque do Ibirapuera, em São Paulo. Cada módulo é dedicado a um capítulo ou tema distinto dentro do vasto panorama retrospectivo da cultura brasileira, da pré-história à arte contemporânea. O módulo afro-brasileiro, ocupando parte do pavimento superior do Pavilhão da Bienal de São Paulo, focaliza as influências da arte e da cultura africanas, que aqui chegaram através dos escravos trazidos para trabalhar na lavoura e nos serviços domésticos e urbanos, entre os séculos XVII e XIX.
O projeto da curadoria procura explicitar as relações entre a produção artística brasileira de expressão africana – obra de artistas e artesãos descendentes dos escravos – e a matriz africana, representada por um núcleo composto de três conjuntos de obras históricas, correspondentes às três principais regiões de procedência dos africanos trazidos para o Brasil: Congo, Angola e Benin. A exposição pretende indicar a fonte de certas diversidades, bem como os caminhos de outras tantas fusões e combinações que definiram uma especificidade da arte de expressão africana produzida no Brasil.
O projeto museográfico parte dessa mesma matriz tripartite, traduzindo-a numa espécie de bolsão trilobado que ocupa o centro do salão. É definido por paredes curvas feitas de cortinados de seda, estendidos do teto ao piso, nas três cores correspondentes aos três tipos de terra das regiões africanas representadas; a referência também é utilizada no tratamento do piso dos três lóbulos. No interior do núcleo central simbolicamente configurado são apresentadas as obras de arte africanas, dispostas sobre praticáveis tingidos de azul-ultramar profundo, reunidas em uma única vitrine de cristal laminado muito longa que atravessa as três terras e se apresenta como uma síntese das referências ancestrais.
A partir dessa invocação memorial, múltiplas realizações afro-brasileiras se espraiam por todo o salão, todo ele envolto num manto negro também de cortinado, como fundo expositivo a um só tempo neutro e racialmente conotado, e por sobre um piso que agora é tratado como se de areia branca fosse feito, correspondendo a um Brasil onde todas as influências se combinam e se fundem na construção de uma identidade específica.
As obras desses artistas brasileiros de ascendência africana, ora ocupando o centro do espaço, ora suspensas por fios transparentes, levitando contra o fundo preto dos cortinados envoltórios, vão contando a história das múltiplas e variadas formas de assimilação dos valores plásticos e dos códices rituais de tradição que aqui se produziram em contato com as demais influências culturais de origem européia e indígena. A inspiração miesiana (Velvet and Silk Café, Berlim, 1927) é notória na desmaterialização do muro-suporte através dos panejamentos ondulantes e etéreos, como vestimentas cênicas contra as quais se desenham objetos liberados do seu peso concreto e assim potencializados em sua pura expressividade visual.
Quando necessário, o muro-suporte intervém sob a forma de fragmento simbolicamente recuperado da arquitetura de terra do Benin, com seus contrafortes maciços de aspecto cônico e a rugosidade de sua superfície. Transforma-se em totem para a afixação de texto de apoio ou em mural extenso para a disposição linear de referências cronológicas. Juntamente com as demais texturas, cores e formas, essa referência construtiva e matérica colabora na construção de um ambiente grave e profundo, despojado e primitivo, um cenário ao mesmo tempo sacro e informal onde se revelam de maneira simples princípios essenciais do ethos negro no trato da expressão artística.
CALDEIRA, Vasco. Exposição de Arte Afro-Brasileira – Brasil 500 Anos Artes Visuais. In: FANUCCI, Francisco; FERRAZ, Marcelo Carvalho. Francisco Fanucci, Marcelo Ferraz: Brasil Arquitetura. São Paulo, Cosac Naify, 2005, p. 76.