equipe:
francisco fanucci, marcelo ferraz, luciana dornellas, victor gurgel com carlos eduardo comas, andré villas boas, anne dieterich, anselmo turazzi, cícero ferraz cruz, felipe zene, gabriel mendonça, gustavo otsuka, harold ramirez, hayako oba, julio tarragó, laura ferraz, pedro ivo freire, rafael saldanha duarte, vinícius spira e william campos
Área: 8.571m2
Fotos:
cassio zaneti e fred mayer
Descrição:
Depois da intervenção de Lúcio Costa no sítio histórico de São Miguel das Missões, com seu assertivo projeto e construção do pequeno museu (hoje Pavilhão Lúcio Costa), fica muito claro que qualquer nova intervenção deve seguir as diretrizes – explícitas e subjetivas – de respeito e conformidade com o bem que se quer preservar, seja do ponto de vista físico – ruínas, muros, pedras e o próprio museu –, seja do ponto de vista do que se imagina ter sido a epopeia das missões guaranis do século 18, justamente a partir desses elementos remanescentes na paisagem.
O azul do céu imenso da planura pampiana, o verde do gramado e da vegetação exuberante e o vermelho óxido de ferro das pedras das ruínas da igreja e do Pavilhão Lúcio Costa dominam a memória visual de todo visitante. São cores que se destacam quase únicas na paisagem, construindo a tela de nosso imaginário.
Um projeto de intervenção no sítio histórico de São Miguel deve considerar as necessidades atuais da vida socioeconômica de uma comunidade de base agrícola e a particularidade de levar em seu coração uma riqueza cultural enorme. E esse enclave de patrimônio histórico deve ser ativado em favor da comunidade pelo seu potencial turístico; deve colocar a história como aliada na construção da cidade contemporânea e, por outro lado, fazer com que o patrimônio reviva em bases atuais de relacionamento, usos e necessidades. Assim como influenciaram o projeto de Lúcio Costa para museu, em 1938, as ocupações urbanísticas da redução de São Miguel, no século 18, nos ajudam agora a encontrar uma partida, ou lógica, para o projeto do novo conjunto arquitetônico. O grid espanhol de malha rígida utilizado no ordenamento urbanístico jesuíta, apesar de aparecer somente em resquícios de construções e de marcas no terreno, ou nos desenhos e registros antigos, nos dão as dicas para o projeto. Nos dão segurança
na conceituação e adoção de imagens e formas que, mesmo longínquas ou simbólicas, sustentam nosso ordenamento modulado no modo da cidadela missioneira.
A pedra vermelha das ruínas nos sugere o caminho a
seguir, seja utilizando o concreto ciclópico com a própria pedra grés, seja utilizando o concreto armado pigmentado em óxido de ferro, criando um continuum tectônico de respeito ao patrimônio construído. A utilização de tecnologias atuais de construção reforça essa distinção dos tempos, fazendo com que concreto se afirme como nossa pedra contemporânea.
Para a implantação de um conjunto de edificações que deverá abrigar um rico e variado programa de atividades e usos, escolhemos o flanco Noroeste da borda do parque, sítio este já sugerido em estudos do Iphan. Assim, continuará reinando, desimpedida, a vista que se tem da igreja para os campos
de fora, ao Norte. Esse visual que proporciona ao visitante a experiência da transposição para o tempo passado é uma das maiores riquezas do local e revela a sabedoria dos jesuítas ao escolher a coxilha da região para fundar a redução.
O programa de atividades e usos propostos pelo Iphan
e pela municipalidade está pautado em nosso projeto pelas ideias de acolhimento e convivência: um grande receptivo
para o visitante turista e para o habitante local ou da região; um polo de atendimento às demandas de mais conforto e adequação para as atividades de convivência do Centro de Tradições Nativistas, para as atividades técnico-administrativas da Secretaria de Turismo do município, e para os escritórios do Iphan e do Instituto Brasileiro de Museus – Ibram, com seus laboratórios, biblioteca, salas de pesquisa. Tudo isso integrado e em consonância com o funcionamento de um novo museu que venha enriquecer a experiência da visita ao sítio.
Todas essas atividades serão alocadas em um conjunto arquitetônico com construções novas unidas e separadas entre si; ou seja, com autonomia de funcionamento de cada setor, mas também com proximidade colaborativa de vizinhanças quando necessária a integração, à imagem de uma cidadela.
Ocupando duas quadras cortadas pela rua São Nicolau, o novo conjunto será articulado por uma grande – e longa – praça em seu miolo. Essa praça, circundada pelos edifícios vermelhos em concreto e pedra, trará, mesmo que longínqua, a memória dos claustros e pátios dos colégios jesuítas. O frente a frente desses dois polos, um mais ligado à vida local e outro mais aberto às visitações turísticas, deverá criar uma tensão sadia no nível de suas programações, em função das mesclas de usos de seus espaços e serviços que serão compartilhados.
Como parte e extensão do conjunto da cidadela, ao lado do museu haverá uma nova casa de passagem para os índios m’biá guarani, integrada ao conjunto, mas também com privacidade para as famílias pela possibilidade física de isolamento com seus muros e hortas.